Fonte dos mais escusos desejos é a Luxúria, irmã dedicada da Inveja e
da Insegurança.
Insegurança que nos ata a conceitos e pré-conceitos fúteis,
vigorados e revigorados pela força da história.
Insegurança que nos faz fracos,
covardes, medrosos de viver. Medrosos de ousar, de experimentar o novo.
Não
um novo moderno, que se traveste em devaneio masoquista. Um novo falso,
mascarado, ilusório. Fantasia sexual de uma mesmice perpetuamente inacabada.
Novo moderno que nada mais é do que a maquiagem tosca, a reciclagem precária, o
falseamento digital às custas de “photoshop”. Uma “Derci Gonçalves” de
operações plásticas “rejuvenescedoras”. Puxadas e repuxadas de pele que ao
sorriso fazem contrair a bunda. Um novo moderno que nada mais é do que um
“Jatevi”[1] do dia
anterior. Um risoto ou salpicão de restos de outrora.
Não, não é esse novo o que nos falta.
A
esse o tenho enojado, enjoado, saturado e expurgado de meu aparelho digestivo,
pelo caminho natural de fato.
O novo que nos falta, que nos impele a
ousar, é outro. É um novo “novo”. Um novo que, apesar de poder ter sido novo em
outras épocas remotas, ainda não o é na atualidade em condição merecida. Um
novo que se mova, que nos mova. Que nos salve dessa poça de excrementos
intelectuais que colecionamos no decorrer de nossas vidas. Um novo que nos dê a
mão e nos puxe dessa areia movediça na qual fundamos os alicerces de nossas
moradas. Que nos tire da dúvida pela dúvida, da crítica pela crítica, da
verdade pela verdade. Um novo que não se perca no meio. Que não se afogue no
nada.
Como uma vampira sexual, a Insegurança
nos suga, gota por gota, cada mililitro do sangue que, em nossas veias, pulsa
quente pela excitação do conhecer, do explorar, do adentrar em matas nunca
antes percorridas.
E com o torpor de sua língua hábil, nos
faz balbuciar sons ininteligíveis que não dizem nada, apenas incomodam os
vizinhos com ruídos impertinentes. Ruídos que os atiçam e provocam sua mais
profunda inveja no fato de quererem, também, participar dessa orgia de memória
e abstinência de pensar.
E a tal sacrifício e libação a Apolo,
não poderia faltar a mais promíscua de todas as três irmãs gêmeas, a Luxúria.
Ela que nos oferece o brilho e a sensualidade da exposição do ego. A fama, a
glória, o prestígio, a exaltação, a diferença, o orgulho, a honra, a vaidade, o
poder.
Ela nos brinda a sermos senhores de
idéias de outros. Idéias roubadas, espoliadas, deturpadas, alienadas. Idéias
que já perderam a validade determinada pelo ministério da saúde. Idéias que
podem causar câncer, pigarros, impotência sexual, dentes amarelados, mau
hálito, enfisema pulmonar e até mesmo, por mais ridículo que possa parecer, a
completa burrice em sua forma mais pura, no sentido mais literal e mais
figurado possível.
E elas, as irmãs modernas de nossas
tentações, nos seduzem, nos beijam, nos acariciam, nos abraçam, nos embriagam e
nos deixam em tal ponto de perfeito delírio que nos tomam sob controle e rédea
curta. Escravos sexuais de suas mais pecaminosas taras e perversões.
E quando nos encontramos em tal estado
de alienação, tais como zumbis acéfalos, é que nos são sussurrados os anseios e
as vontades de nossas senhoras e amas. É nesse estado de completa ausência que
recebemos nossas ordens, nossa missão. Nosso papel a ser desempenhado como
filósofos modernos que somos.
Então nos tornamos protagonistas de sua
tragédia. Parte do ritual profano que amaldiçoará o íntimo de nossas
existência.
Nos
são ungidos os membros com o bálsamo afrodisíaco da razão e nos são vendados os
olhos com a seda pura da argumentação.
A vítima já se encontra amarrada,
acorrentada, açoitada e jogada aos pés de nossa indiferença.
Nos é dado o comando. A deixa para
entrar em cena.
Com
um impulso primitivo, animal e mundano, a barbárie alça vôo em nossas mentes,
palavras e ações.
Finalmente, a vítima é consumada.
E só lhe resta chorar.
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